Como criar um sci-fi à brasileira: entrevista com Eduardo Piagge, diretor de fotografia de 3%

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Eduardo Piagge foi diretor de fotografia dos documentários Tropicália (2012), de Marcelo Machado, e Barbeiros (2012), de Luiz Ferraz e Guilherme Aguilar, entre outros. Foi ele o escolhido para criar o ambiente pós-apocalíptico de 3%. Na entrevista exclusiva, ele fala sobre os desafios, as referências e as escolhas que deram base ao universo de ficção científica da série.

 

Spcine – Como foi a experiência de desenvolver a fotografia de uma série de ficção científica à brasileira?

E.P.: Queríamos realmente dar uma cara diferente para o 3%. O desafio sempre, em produções desse tipo, é romper a distância entre o mundo ficcional, futurista, distópico e a nossa sociedade, a realidade atual em que vivemos. Sempre acreditamos que seria a partir da dramaturgia, dos personagens, que a audiência conseguiria embarcar no universo do 3%. A linguagem documental da série, a câmera na mão, foi uma maneira que encontramos de aproximar a audiência dos atores, de tentar sempre ter uma câmera narrativa e sensível aos sentimentos dos personagens. A idéia era fugir de uma decupagem esquemática, previsível. Todas as escolhas derivaram disso. Iluminamos a maioria das cenas projetando uma câmera solta, que pudesse se movimentar, seguindo a movimentação dos atores e abrindo espaço para um set criativo, mais livre. Preferimos usar projetores na maioria das cenas com telas e interfaces, ao invés de aplicarmos na pós.  O tempo inteiro, buscamos as soluções que nos permitissem manter essa linguagem. Foi um esforço constante durante toda a produção.

Spcine – Quais são as referências para a criação do universo imagético de 3%?

E.P.: O Lado De Cá, nós aliamos o trabalho de alguns fotógrafos e fotojornalistas, como o Gilles Coulon (uma dica preciosa do Valdy Lopes, nosso diretor de arte), com o trabalho de artistas como Artur Bispo do Rosário. O Processo foi construído muito em oposição a esse mundo caótico e colorido do Lado de Cá. Queríamos algo bem institucional, limpo, perfeito. Ao mesmo tempo convidativo. De certa maneira, nos inspiramos nesse novo estilo de corporações que parecem estar dominando o mundo dos negócios, as famosas “prisões coloridas”. Apenas tiramos o excesso de cor, que ficou no continente. As provas foram pensadas para serem mais teatrais. Por isso são mais densas, contrastadas, com uma luz mais dura, cênica. Então temos esses três “mundos”: o lado de cá, o processo e, dentro do processo, as provas.

Spcine – Você pode dizer quais foram as locações utilizadas? E qual o trabalho para integrá-las no universo de 3%?

E.P.:  Filmamos basicamente no centro de São Paulo e na Arena Corinthians. Também fizemos uma boa parte da série em estúdio.

Eu acho a arquitetura do Itaquerão incrível, com muitas rampas, mezaninos, um grande vão livre, vidros, reflexos, e banhado por uma luz natural linda, indireta, quase o dia inteiro. Nosso esforço lá foi o de enquadrar e garantir a consistência visual entre as cenas, eliminando os muitos elementos do prédio que não nos interessavam. Ele funcionou muito bem como contraponto luminoso, estéril ao mundo caótico e colorido do lado de cá.  Em geral, o grande trabalho mesmo foi da Direção de Arte que precisou, obviamente, adequar as locações a uma lógica futurista utópica ou distópica. O Continente, por exemplo, tem fontes escassas de energia. Uma solução que usamos bastante foi brincar com dínamos, de vários tamanhos e tipos. Foi importante para termos mais fontes de luz disponíveis para trabalharmos nas cenas do lado de cá e não ficarmos apenas nos lampiões e velas.

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